Uma palma interrompida. O rapaz caminhava trocando causos com a pessoa que ia ao seu lado. Preparou o corpo para ilustrar a conversa com uma palma. Uma pessoa vinha no sentido contrário. O exato instante da palma coincidiria com o exato instante do cruzamento dos dois fluxos. E num reflexo, talvez, o rapaz conteve seu gesto em um possível segundo. Não houve a coincidência, evaporou no exato instante da percepção. Seria isso um fato racional?
Eu tenho perdido o melhor de mim. Em cada reflexo que a percepção gera, surge a dúvida do que se perde. Em cada estimulo de pensamento, tenho perdido mais de mim mesma. Embora a lógica afirme que eu esteja ganhando. Não tem sentido.
A Senhora Dona da Verdade tinge os cabelos, escondendo o rosto atrás deles. Ela é uma personagem, oposta a tudo que realmente é. Inteligente o suficiente para se dar conta do que é, do que pensa que é, e do que não é. Mas ela tem medo, ao que tudo indica, embora também tudo indique muitas outras coisas também. Eu conhecia a personagem dela muito bem. Eu era parte do coro dos contentes que cantavam honrarias em sua homenagem. Mas esse é o problema ao se assistir muitas vezes o mesmo filme, muitas vezes a mesma peça, muitas vezes a mesma canção. Partimos para extremos inevitavelmente.
Eu tenho perdido o melhor de mim. Em meio a 23* pessoas, eu consegui enxergar a existência de pessoa e personagem naquela que falava. A percepção não deu fim na coincidência. Em muitas pessoas ali eu senti que também elas têm perdido o melhor de si mesmas.
* usei esse número em específico por ter sido mencionado numa palestra dias antes, talvez faça algum sentido para mim.