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Embaixo de um toldo, o casal. Ela olha para o céu que pinga. Ele olha para os pés encharcados.
Ela – A chuva parece cair mais bonita aqui na Avenida Paulista.
Ele – A chuva é a mesma em qualquer lugar.
Ela – E foi isso que eu disse: parece!
Ela baixa o olhar para os pés molhados. Ele olha ao redor.
Ambulante – Olha o guarda-chuva! Guarda-chuva!
Ele acompanha com o olhar o rapaz que grita atravessando a rua. Ela volta a olhar para as gotas de caem lá do alto.
Ela – Isso foi rabugento, vai… pode, sim, ser mais bonita se a gente quiser!
Ele – Ok, se você quiser… mas ainda assim vai continuar molhando a gente. Vamos comprar um guarda-chuva!
Ele faz sinal para o vendedor que corre até o toldo. Ela observa a negociação.
Ele – Pronto, vamos!
Ela – Você gastou 15 reais numa armação de plástico preto que não vai servir para coisa alguma, tudo porque quer se convencer que a chuva é a mesma em qualquer lugar…
Ele – Ai, caralho! Começou…
Ela – Não. Eu terminei.
Ele – ?
Ele fica, parado, metade do corpo embaixo do toldo a outra metade embaixo do guarda-chuva recém aberto. Ela sai andando, em poucos segundos sua figura encharcada atravessa a rua, com a boca entreaberta mastigando gotas de uma chuva diferente.
Ele – Espera! Depois vai ficar doente…
Ela não espera. Logo ele também parte, encolhido sob o guarda-chuva ditando passos curtos.
–
Em algum momento eles chegarão a algum lugar, ambos molhados, ela um pouco mais. No outro dia ele irá acordar resfriado, ela o evitará para não se contagiar. O distanciamento de como encarar a chuva poderá nem ser lembrado, mas persistirá até a rendição de tudo que segue para evoluir.